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  • Dr. Cleverson Ramos Lima

Recebi uma cobrança indevida e paguei para que meu nome não fosse negativado. O que fazer?

Atualizado: 4 de nov. de 2019



Coisa muito comum de se encontrar em clientes com causa de natureza consumerista, é a dúvida sobre o que fazer quando são vítimas de uma cobrança indevida por parte de um ente jurídico.


Tal controvérsia encontra-se sanada pela própria Lei 8.078/90, em seu Artigo 42, § único, que regra a repetição do indébito:


Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. G.N.

Numa tradução popular, a repetição do indébito nada mais é que a sanção aplicada ao infrator, que concede ao ofendido a devolução do valor cobrado indevidamente, com indenização equivalente a 100% do valor cobrado de maneira irregular. Ou seja, se eventualmente sua empresa de telefonia insere em sua fatura cobrança de serviços pelas quais você não contratou e não fez usufruto, a Lei acima mencionada garante a devolução dos valores indevidos em dobro. Tal instituto se aplica a quaisquer entes jurídicos que venham a auferir lucro se utilizando deste expediente. Como exemplo, demonstramos julgado recente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:



JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TV POR ASSINATURA. COBRANÇA DE PONTO ADICIONAL. ALUGUEL DE EQUIPAMENTO. DEVER LEGAL DE INFORMAÇÃO. INOBSERVÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DE CONHECIMENTO E DE VONTADE DO CONSUMIDOR. ENCARGO INDEVIDO. MÁ-FÉ DA COBRANÇA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DEVIDA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.


I. Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora face a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Em síntese, sustenta ter celebrado com a parte recorrida no ano de 2014 contrato de TV por assinatura. Afirma que suas faturas apresentam cobrança sob a nomenclatura ?aluguel de equipamento digital?. Argumenta tratar-se de cobrança vedada pelas Resoluções Normativas n. 488/2007 e 528/2009, bem como Súmula 9, todas da ANATEL. Pugna pela reforma da sentença para que os pedidos iniciais sejam julgados procedentes.


II. Recurso próprio e tempestivo, com preparo regular (ID 10395827-10395830). A parte recorrida manifestou-se em contrarrazões (ID 10395833).


III. A relação entre as partes apresenta natureza consumerista, o que atrai a aplicação do CDC, haja vista o dispostos nos artigos 2.º e 3.º da Lei 8.078/90. A Resolução 488 da ANATEL, com a redação dada pela Resolução 528/2009 estabelece em seu art. 29: ?A programação do Ponto-Principal, inclusive programas pagos individualmente pelo Assinante, qualquer que seja o meio ou forma de contratação, deve ser disponibilizada, sem cobrança adicional, para Pontos-Extras e para Pontos-de-Extensão, instalados no mesmo endereço residencial, independentemente do Plano de serviço contratado?. Não se debate, portanto, a cobrança pela prestação de serviços no ponto adicional, proibida pela Resolução, e sim o aluguel do aparelho transmissor pela prestadora de serviços.


IV. De fato, a cobrança pelo equipamento relativo aos pontos adicionais não é vedada, pois o mais moderno posicionamento do STJ, expresso no Resp 1.449.289/RS, valida a cobrança das taxas impugnadas. Necessário, todavia, que o consumidor seja expressa e previamente informado quanto à cobrança dos pontos adicionais, o que não ocorreu no caso em exame. Com efeito, o art. 6. º, III e o art. 46 do CDC estabelecem para o fornecedor o dever de prestar informações claras e completas acerca dos produtos e serviços disponibilizados ao consumidor.


V. In casu, não consta tenha sido apresentado ao consumidor contrato de aluguel para o decodificador, nem que tenha sido colhida sua aceitação quanto à contratação de aluguel de aparelho. Dessa forma, a conduta da parte recorrida demonstra a violação ao princípio da livre contratação e do direito de informação ao consumidor.


VI. Assim, a cobrança revestiu-se de abusividade, porquanto realizada de maneira sorrateira no curso da relação contratual, sem comprovado lastro no contrato ao qual o consumidor aderiu, o que afasta qualquer alegação de boa-fé. Ausente engano justificável, a restituição deve ser feita na forma dobrada (CDC, art. 42, p. único). Precedentes: Acórdão n.1186531, 07114631420198070016, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA Segunda Turma Recursal, Data de Julgamento: 17/07/2019, Publicado no DJE: 22/07/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada; Acórdão n.1175185, 07476557720188070016, Relator: FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 31/05/2019, Publicado no DJE: 07/06/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada; Acórdão n.1189442, 07541998120188070016, Relator: ASIEL HENRIQUE DE SOUSA Terceira Turma Recursal, Data de Julgamento: 31/07/2019, Publicado no DJE: 06/08/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada.


VII. Quanto ao valor devido, a parte recorrente comprovou ter diligenciado, sem êxito, no intuito de obter as faturas que retratariam a cobrança no curso dos últimos 3 anos. Ademais, não houve impugnação específica quanto ao valor pleiteado. Desse modo, merece prevalecer o montante pleiteado.


VIII. Entretanto, como, na esteira de precedente do STJ (Resp 1.449.289/RS) a tarifa não é, por si, indevida, não há que se impor a obrigação de não fazer, pois caso a recorrida venha a apresentar ao consumidor o contrato de locação do equipamento e este a ele adira, não há óbice à cobrança.


IX. Recurso conhecido e provido em parte para julgar parcialmente procedentes os pedidos iniciais e condenar a parte recorrida a pagar à parte recorrente a importância de R$ 9.730,80 (nove mil setecentos e trinta reais, oitenta centavos), relativa ao dobro do valor cobrado a título de aluguel de equipamento habilitado, no período de dezembro/2015 a novembro/2018, valor a ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir do vencimento de cada fatura (ID 10395816) e acrescido de juros moratórios de 1% a.m. desde a citação. Custas recolhidas. Sem condenação em honorários advocatícios (art. 55 da Lei 9.099/95). (TJ-DF 07057246020198070016 DF 0705724-60.2019.8.07.0016, Relator: GABRIELA JARDON GUIMARAES DE FARIA, Data de Julgamento: 21/08/2019, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 29/08/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.) G.N.

 


Por outro lado, é importante salientar que o referido instituto só é aplicável na hipótese de não haver justificativa para engano, conforme grifado acima. Na hipótese de que este ente jurídico de fato tenha te cobrado indevidamente, mas apresente justificativa plausível para um eventual equívoco, você ainda faz jus à devolução dos valores, mas de maneira simples, não fazendo jus à repetição.


Como exemplo, em audiência feita ainda nos meus tempos de estagiário em que um requerente busca a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente pela concessionária de serviços de água e esgoto de Belo Horizonte, foi efetuada a devolução simples dos valores, visto que o preposto, munido dos documentos defesa comprovou que o hidrômetro instalado na residência do requerente oscilava, cobrando as vezes mais, as vezes menos, mas feita a média, ainda colocava o promovente no prejuízo.


Vez que comprovado pelo preposto que o defeito do equipamento induziu a concessionária ao erro, foi afastada a repetição do indébito, fazendo apenas jus o autor a devolução simples dos valores cobrados equivocadamente.


Neste sentido, utilizo aqui como exemplo prático jurisprudência recente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em ação envolvendo Planos de Saúde:


APELAÇÃO CÍVEL- PLANO DE SAÚDE- REAJUSTE- ABUSIVIDADE- APLICAÇÃO DO CDC- REPETIÇÃO DE INDÉBITO.

O reajuste das mensalidades de plano de saúde deve ser realizado em patamar razoável, pois, tratando-se de relação de consumo, consideram-se nulas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. Não havendo comprovação de má-fé, a repetição de pagamento indevido deve ser feito na forma simples.

(TJ-MG - AC: 10000190709279001 MG, Relator: Estevão Lucchesi, Data de Julgamento: 27/08/0019, Data de Publicação: 29/08/2019)

 

Insta frisar, que muito embora seja tema controvertido, sem consenso no judiciário, é possível a cumulação da indenização dos valores indevidos com eventual sansão em danos morais. Neste aspecto, o pedido de eventual sansão fica melhor constituído quando comprovado que a cobrança indevida impediu que a vítima da conduta antijurídica tenha sido privada de algum direito, ou impedida de arcar com compromissos regulares em razão do ilícito, mas isso é assunto para outro artigo.


Esperamos ter lançado luz sobre o tema, retirando dúvidas que eventualmente possam assombrar vítimas desta conduta. Um abraço e até a próxima.


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